sexta-feira, 27 de junho de 2025

Maremoto

26/06/2025
 
As brisas em meus ventos uivantes
são sempre cortantes.
Facas que cortam minha carne;
arrancam minha pele.
Os pulmões incendeiam,
mas nada me fere.
Nada me fere!
 
Caio sem rumo num mundo
que me engole.
Pois que engasgue!
Sou fuligem;
fumaça num verso esnobe.
Cascalho solto na rua a ninguém comove.
 
São tosses amargas de um tísico,
ou alguém largada à própria sorte?
A pá que me enterra
não tem um corpo físico;
não me tem em seu foco.
Não há vulcão em minha terra;
só maremoto.
 
Contra gases tóxicos
um corpo forte.
Um organismo coletivo 
repleto de corpos e anticorpos.
Revolta,
solidariedade,
união.
Em minha terra não há vulcão;
só mar remoto. 

sexta-feira, 4 de outubro de 2024

Sangue e Chamas

04/10/2024

As linhas cortadas de minha mão

sangram,  transbordam minha pele.
Meu peito, essa pavorosa prisão,
pulsa com o brilho que em vão me fere.

Que se encerre a distração!
Meu corpo, um sufoco; um lastro
de angústia, astúcia, sofreguidão.
O sangue me ferve, mas o corpo é vasto;
tem muito espaço para cada sensação.

As mãos no pescoço, uma convulsão.
Os punhos serram quando os dentes rangem.
As línguas ácidas me consomem,
e os pensamentos, como intromissão,
me leem. Seja qual for a conclusão,
os vestígios de paciência somem.

Ora, já chega, pois estou cansado.
O risco de sumir
só escapa na explosão.
Chega de ser fogo.
Agora sou vulcão.
E democracia, meu amigo,
não é imposição. 

segunda-feira, 14 de agosto de 2023

Next time, fuckers

(14/08/2023)


Me confundiam com incendiário.

Mas minhas faíscas só serviam ao sangue.

Borbulhado,

meu corpo permanecia perfurado

pelo ferro em minhas veias.

A cadeia de sulfato

me inundava a glote.

e eu chovia por dentro.


Me encantavam as cinzas.

Os veios de minhas entranhas

sucumbiam ao deslizamento litiar.

Os ventos assassinavam a métrica

desértica de minha geografia ocular.


E então veio o verbo.

No surto, o resquício do sumiço

volta a se encontrar.

O destino, sovino,

encarna as fibras do corrediço.

E a carne começa a oxidar.


Carbonizado,

o verso se converte em fuligem.

A virtude, em vertigem.

E o vasto vazio começa a desmoronar.

O gosto lúgubre, o olfato incerto

e o terror incólume:

vestígios de precessão no incêndio.

Não sou filho do amoníaco,

mas talvez seja do arsênico.

quarta-feira, 30 de novembro de 2022

Arma-me

30/11/2022


Saca-me

Sarra o torso torpe

Torce

Agarra o cabo

Carrega o fardo

Move


Explora a sorte

O calor contaminado

Juízo alado

Pequena morte


Arfa-me

Suga-me o ar

O sangue

O jorro

O fogo-a-jato

O laço

Apaga-me


Afaga-me

Afoga-me

Em seu carinho

Roda mundo

Rodamoinho

Sem solução


No vasto mundo

Soluço

Inundado

Afogado

Resfolegado

Boiando no mar

Chegando a hora de zarpar

Sem anos de solidão

sábado, 3 de setembro de 2022

Amiúde

03/09/2022


Suspiros de noite e de dia.

Olhos abertos, despertos na fantasia

de sentir e ser.

Por dentro, a chama incessante

que só faz crescer.

Por fora, montanhas galgáveis,

cavalgáveis, para subir e descer.


Um rio escorrendo apresenta o caminho.

Nadar e ser embebido, dissolvido

na cachoeira do prazer.

Perder-se no escuro e perder os sentidos,

ouvindo só o que a alma tem a dizer.


Efervescer o ser e sublimar.

Dormir desperto e sonhar

com o mundo caindo de suas beiras.

E quando o corpo todo falhar,

deixar a mente subir às estrelas.

quarta-feira, 20 de julho de 2022

Sono sem Sonho

20/07/2022

 

A força do dia a dia

camufla as cores do mundo.

Sentado em meu canto sozinho,

cansado, observo tudo

com meu olhar daltônico.


Um sono sem sonho

é como estar acordado.

Os olhos ardidos,

a boca seca,

a faca cega.

Sossega esse peito, menino.


Colírio.

Lavar a alma com lágrimas

e terra.

Pé no chão, corpo nas nuvens.

Delírio.

Nós que desenrolam(os) em fios

cortantes.

Mente amolada,

faca.

Sede de fazer o sangue ferver.

Já posso voltar a sonhar,

mas sem esquecer de viver.

quarta-feira, 27 de abril de 2022

Nanopotente

27/04/2022

 

Em meus sonhos posso voar.

Que alegria seria

se em realidade ou fantasia

fizesse o que posso, ao sonhar.


Mas meu corpo vive no mundo real;

sem asas,

sem forças,

sem mãos a me levantar.

Minipotente.

Descrente no fututo

aonde vamos chegar.


Enquanto o sertão não virar mar,

um deserto cinzento é meu chão.

Caminho, sob o sol escaldante,

mirando uma miragem

deveras distante,

mas sem sombras de satisfação.


Esta ilha me devora.

Sendo o futuro incerto,

procuro me manter desperto

à procura de uma aurora.

... mas que demora!

Agora, só resta olhar à frente

- micropotente -

porque atrás vem gente

e não há tempo a perder.


Sou o que sou,

mas quem sou eu de fato?

Sem digitais, sem tato,

esqueço o que sei de mim.

Afinal, o que tenho a dizer?

Nesse mundo não sei voar,

e, enquanto não puder sonhar,

só me resta viver.