segunda-feira, 30 de março de 2015

Conjuntos Abstratos

29/03/2015

Sou um tanto indeterminado.
Uma comunhão das coisas (ir)racionais
e também das não-coisas.
Meu presente é estar presente
e ser (um ser).
O que me foi passado está no passado
(abstração)
e nos acontecimentos futuros
(abstração),
mas não no infinitésimo do presente,
que simplesmente é,
ainda que não o percebamos.

Como seria não ser,
ou ser fracionário?
Ou ser imaginário?
Acho que sou complexo,
porque inteiro certamente não sou.
Queria ser uma abstração,
um não-ser sendo.
Ser um paradoxo é em si um paradoxo.
Uma completude existencial,
um ouroboros ontológico.

tudo passa tudo passa tudo passa
Menos o passado.
E essa chuva que compromete meu futuro
fumega gases tragicômicos da vida.
Gases hilário-lacrimejantes.
Mas esses gases se vão, porque
tudopassatudopassatudopassa
Menos o tempo.
A não ser as horas, que vão se trocando,
e os anos, que vão se confundindo.

tudo passo tudo passo tudo passo
Mas é tanto obstáculo
que não se vê o fim da trilha.
Me sinto preso numa ilha
rodeada por água até onde vai a vista.
Acho que vou me afogar,
pra ver se o mundo marinho
me reserva outra sorte
e se meu azar é estar com os pés no chão.
Ou então vou aprender a voar.
Fazer amizade com os pássaros,
os pingos de chuva e os raios solares.
Tentar me transformar em arco-íris.
Ou vou ficar por aqui, mesmo;
molhar meus pés na água,
nadar de vez em quando
e me reconciliar com a chuva.
Chuva, molha minha alma,
para fazer escoarem minhas dores.

terça-feira, 24 de março de 2015

Astrofilia

15/09/2014

Se houvesse uma intrínseca simbologia
Em ser originário do Planeta Azul,
Viveria com minha existência em duo,
Uma harmonia sem neologia.

Mas em um planeta chamado Terra,
Como poder encontrar tanta água?
Se nada há nesse mundo além de mágoa,
Injustiça, destruição e guerra,

O que há de simbólico em sua cor?
A água representa adaptação,
Mas o ser humano só produz dor.
Para nós só vale a captação

De bens materiais. Somos de fato
Seres terrenos, terrestres. Somos cegos
Galgando nossos caminhos pelo tato
E pela clara escuridão do ego.

Como seria ser oriundo de Vênus?
Seria a existência mais marcante?
Ou a vida talvez um pouco menos
Exorbitantemente ignorante?

A Estrela d'Alva é vista do nosso céu,
Mas do lado de lá, o que pode ser visto?
Sua atmosfera é coberta por um véu,
Deixando um agridoce sabor misto:

O brilho existe, mas só pra quem vê de fora.
Qual o seu valor então para os internos?
A beleza está lá fora, agora
Respirar o ar quente dos Infernos

E discursar na ágora venusiana
Não devem ser experiências tão distantes.
Como não o é atrás de uma veneziana
Se esconder, cheirando gases constantes.

Por outro lado, ser habitante de Marte
Tampouco poderia ser mais positivo.
Pois o que seria mais propositivo,
Com esse nome, que seu estandarte

Carregar a cor e o escudo da guerra?
Terá sido esse o fim dos marcianos?
Guerras por centenas de milhares de anos?
E será esse o fim de nossa Terra?

Talvez eu esteja sendo muito exigente.
Não fosse pela humanidade, decerto
Marte não seria o nome vigente,
E ligá-lo à guerra seria incerto.

Talvez esteja olhando para o lado errado,
Pensando que a solução está n'outro mundo.
Talvez esteja meu pensamento amarrado,
Vendo na terra e no céu o que há de imundo.

Parece-me que o problema está no ser
- Mas não em qualquer um: no ser humano!
Não se pode esperar mais de um ser pro qual ter
Constitui o âmago de seu plano.

Seja Urano, Netuno, Mercúrio, Plutão,
Nem luas de Júpiter, aneis de Saturno
Poderiam iluminar a escuridão
Que envolve nosso espírito noturno.

Se o problema habita em nosso coração,
Olhar para fora não é solução,
Mas sim olhar profundamente para dentro.

Só assim saberemos não ser o centro
Nem aresta; ângulo nem lado:
Cada um saberá amar e ser amado.

quarta-feira, 18 de março de 2015

Peixinho

18/03/2015

Nesse dia, peixinho,
esqueça o que te apavora.
Seja a escuridão do crepúsculo;
seja o brilho da aurora!,
porque quem te olha de fora
te enxerga mais do que peixe:
vê uma sereia poderosa, senhora
de toda água que te contorna.

Siga seu próprio rumo, peixinho.
Não se prenda a correnteza ou corrente,
pois não te controla nenhuma serpente
e é você quem faz seu caminho.
Vá nadando como quiser:
de frente, de lado, de ré
(mas cuidado com redemoinho).

Saiba reconhecer a maré.
Seja parte de suas idas e vindas;
e que as quatro fases da Lua
(todas lindas)
representem sua fé.
Brilhe com o mar sob a Lua.
Navegue no rio lunar,
encante e se deixe encantar,
mas mantenha abertos os olhos.

Não esqueça que o mar também é cruel,
mas não deixe isso te assustar!
Enfrente tubarões ou o que precisar
e lembre que a estrela do mar
é como a estrela do céu.
Não se perca nesse jogo:
saiba que o fogo evapora a água,
mas a água apaga o fogo.

Seja tudo o que almejar:
peixe, ave, fogo, chafariz
e tudo mais que puder pensar.
Seja o brilho do luar
e ame o que quiser amar.
Seja feliz!

sexta-feira, 13 de março de 2015

Noite Macabra

12/03/2015

Em passos vagos sob a noite fria
Refaço na mente meus esforços diários,
Enquanto a noite berra o berro da orgia
De todos os seres vis imaginários.

Em que esquina vai me cruzar a estranha
Sensação do último dia chegado,
Se o terror desse dia mal acabado
Já me corroi toda e qualquer entranha?

Temo a sombra, que na noite escura vaga
Com passos invisíveis ao meu olho,
E o silêncio, essa chave sem ferrolho
Que a paz do meu caminho apaga.

Quando amanhã outra noite cair,
Verei brotar as redes da ilusão,
Soar meu último suspiro de homem são
E o semblante macabro da Lua a sorrir.

Pois nessa noite quem sairá à rua
Terá terrível garra e presa:
Verei do vampiro sua amarga destreza
E o lobisomem a uivar à Lua.

Que deixem sair esses seres tortos
Que não passaram pelo mundo e seus crivos,
Pois se nas outras noites reinam os vivos,
Na sexta-feira treze dominam os mortos.

Hipocrisia

12/03/2015

Tem dias que o universo
parece estar contra a gente.
Mas acho isso tudo muita presunção.
É prepotência demais achar que o universo
- esse nada todo -
vai perder seu tempo,
gastar sua energia
tratando de minha vida.
Nesses vinte e seis anos,
quem sou eu na idade astral?
Sou como uma célula,
que é parte do organismo,
mas morre muito mais cedo que ele.
E quando morre, não se sabe de sua morte.
Não existe velório para a célula...
Caixão, lápide, luto...
Seu nome não aparece no obituário.
É verdade que não passo de comida de verme.
Encerrarei meus poucos anos de idade astral
como uma massa fétida, repleta de gases,
devorada pelo Deus Verme.
E quando lembro que meus pesares
mais parecem histeria perto do sofrimento
que vemos tanta gente passando,
peço que o universo fique a favor dessas pessoas.
E me sinto tão podre em minhas queixas
que desejo o fim de minha existência celular,
para que minha massa fétida
tenha enfim alguma serventia.

domingo, 8 de março de 2015

Dia de Luta

08/03/2015

Eu não aguento mais sorrir,
quando eu quero é chorar.
(incoerência)
A hipocrisia tenta me calar,
mas eu não vou ficar calada,
mesmo cansada,
eu vou gritar pra poder ser escutada.
Não quero ser cão que nem morde nem ladra,
Mas ao me ver domesticada, em subemprego,
tentando ser valorizada, mas sem sossego,
eu fico mesmo é infeliz,
sem acreditar num bom futuro,
sem coragem pra enfrentar o mundo,
sem força pra pular o muro.
Então para!
A verdade que não cala
vem sussurrar em meus ouvidos,
me dar forças pra sair da vala.
Levanto os olhos para o céu,
tentando achar a salvação,
que aqui de baixo não vejo nada,
nem conto de fada, nem solução,
mas lá de cima também não.
Não!
Então me diga como eu posso
sorrir com satisfação.

Não,
não quero um dia pra mim, não.
Eu quero é liberdade, igualdade, compreensão.
Quero orgulho da minha vida, e mais satisfação.

E agora, a mentira que não cola
de que todos somos iguais.
Que brincadeira... não me enrola!
Não tô acostumada a ser enganada;
eu não sou burra, isso não rola.
Então vamos falar a verdade.
Não sou de jogar conversa fora,
falando de trivialidade,
de novela ou coca-cola.
Eu quero é mais.
Mais!
Um bom salário, um bom emprego;
quero direitos, não quero esmola.
Quero poder andar na rua
sem medo de ser estuprada
e ainda ouvir um homem falando
"Era ela que tava errada,
com aquela roupa, aquela conduta,
não era moça, era puta.",
e ainda ter que ouvir essa merda calada,
porque eu sou amordaçada
todo dia, toda hora,
pelo machismo que ainda existe,
que persiste, não foi embora.
Então para!
Não cala, não chora.
Vamos à rua, vamos à luta,
sem medo e sem demora.
É agora!
Vamos lutar para vencer!
E se eu morrer?
Não me arrependo, não dei o braço a torcer.

Não!
Não quero um dia pra mim, não.
Eu quero é liberdade, igualdade, compreensão.
Quero orgulho da minha vida e um bom futuro.
Pega a visão!

Mas não é só do nosso lado
que a corda sempre parte;
no mundo tem muito ódio
e toda sorte de covarde
que aproveita de sua condição,
de sua suposta "normalidade",
pra fazer tanta besteira,
toda forma de atrocidade
e sair ileso,
porque "é aceitável, não se abale",
mas não.
Não!
Não tenho a menor condição
de ouvir de gente assim
qualquer discurso e manifestação
de sua completa arrogância, ignorância e podridão,
quando vira para mim
e diz sem exaltação:
"Hoje eu tô meio abalado,
porque não sei o que é ser reprimido,
marginalizado, linchado,
ser julgado culpado
por um crime que não cometi,
ser acuado pela cor ou lugar onde eu nasci.
Mas hoje eu vi um mendigo no chão
(que pena).
Tava largado, comendo lixo,
enquanto eu ia pra Ipanema
pegar uma praia, pegar um sol,
mas não esquenta não, irmão,
mais tarde eu vou prum bar,
me embriagar,
esquecer a tristeza no lençol,
porque pra mim vai tudo bem.
Não preciso me incomodar,
já que nada vai me faltar,
amém."

Não!
Não quero um dia pra mim, não.
Eu quero é liberdade, igualdade, compreensão.
E distância dessa gente que cospe em quem tá no chão.

Mas o mendigo ainda tá ali,
comendo o lixo do playboy
que no outro dia já se esquece;
isso me mata, isso me dói!
Vejo minha gente acuada,
seu sangue no chão,
e não ouço sua voz.
E agora?
Onde anda nossa aurora?
O preto pobre é como um vírus
nos olhos da sociedade:
deve ser exterminado
para a "limpeza" da cidade.
A favela é invadida
por um bando de covarde
que exala morte
e muito mata.
(isso é maldade)
Com a desculpa da guerra às drogas...
Ah...!
É rir pra não chorar!
Melhor gritar, ir pra luta,
não se virar, não descansar,
porque esse mundo não tá perdido.
Não vou deixar me abalar!
E agora o quê?
Me deixa viver!
Tô preparada pro combate,
já tô cansada de sofrer.
E no final?
Aonde isso vai parar?
Já passei por tanta coisa...
não tenho outra face pra virar...
Agora você entendeu por que minha vontade é de matar?

Não! (pra quê?)
Não quero um dia pra mim.
Quero viver!

domingo, 1 de março de 2015

Ilha de Itaparica

01/03/2015

O tempo passa o tempo todo,
só para no domingo,
quando passam os meus ventos,
em passos na areia,
em mares de sentidos.
Mares que por ora
só habitam a lembrança;
os carros na avenida embaçam a vista,
a fumaça se faz brisa
no peito de quem só avista
o mar e a Ilha de Itaparica.

O que está distante, está perto,
o que está perto, está longe.
Habitar sem pertencer,
o que seria a inversão dos sentires.
Sentires que também são quereres
- onde queres asfalto, sou baía -,
quando transformados em versos,
prosas, poesias e histórias
(reais e imaginárias),
elementos ar e água
transbordando,
transcorrendo...
o tempo do agora!,
que se faz presente na saudade.

Saudade que é fogo,
pois tudo que saúda a todo tempo
queima.
Queima como um ardor
que embaça a vista,
que nos coloca os pés na pista
da lembrança e da esperança
de um dia se banhar no mesmo mar
- não há quem resista -,
aquele que traz o Sol, com seu pôr,
com seu farol,
e aquela mesma alegria
que flutua em tudo o que fica
- meu pensamento, meu sentimento -
na Ilha de Itaparica.



Escrito em parceria com Salete Alves e Talula Mel.

Palavras Contadas

01/03/2015

Não se distancie,
não se ria,
não se embriague em mim.
Beba do meu mel
que contagia,
que cura a garganta ruim.

Ora, o que eu digo?
Que ousadia!,
querer mandar em você assim...
Não mando em ninguém, não.
(que fantasia!)
Mal mando em mim. Enfim...!

Mas você, que não vejo há tanto tempo,
que não sai do meu pensamento,
por que me trata assim?
Transpiro em meu suor uma história,
gravada em minha memória,
que não pediu um fim.

Mas antes de mais nada,
com a vista cansada,
vou te falar (preste atenção!):
isso foi tudo uma brincadeira,
uma alegoria,
um jogo de luz e ilusão.

Falei com uma certa inocência
(malemolência)
que me deu satisfação.
E se você aí lendo está confusa,
achando que é minha musa,
não viaje, que isso aqui né pra você, não.